...

Às vezes eu acho que esses lugares não existem como nas historias infantis ou como uma miragem que só existe quando a gente esta lá, porque quando a gente vai embora esse lugar desaparece.







30.6.10

...Amigos, como tudo na vida se modifica, com o meu Blog não foi diferente, estou mudando o titulo!

26.5.10

Memória Inventada

Hoje eu inventei uma memória
Acordei com a imagem na idéia
A criança que eu fui: Não sou!
O herói que me salvou: Não é!
Ausentes do passado
Inventados no presente
Lugares nunca visitados
Um labirinto de saídas
E uma paisagem recortada
Invenção horizontal
Estou agora no depois
E quando chegar a vez
Estarei no antes

E o fim...

Rocha

18.5.10

Horas do Dia Terrestre

As horas correm as ruas

Entre passos leves e ligeiros cotidianos
Outros pesados passos marcados no chão
Coreografia ritmada pelo tempo
Meu descompasso compõe uma musica

A cidade dança o espaço que ocupa
Eu danço o caos como um antigo recente samba
O dia não sabe onde está indo
Porque não sabe onde esta
Sigo a linha do contorno com muito cuidado
Para não cair na roda
E correr o risco de ser riscado
Na confluência do fluxo
Faço a curva do incessante incerto
E quando percebo estou de volta

E agora? O que eu faço com toda essa nostalgia?

Rocha

28.3.10

Lugar II

Chão áspero
Moinho em movimento contrário
Catinga e uma estrada de horizonte
Na cabeça a cabaça
No pé a pele grossa
O vento em brisa banhou
E o sol anunciou luz lá em Pilão Arcado
Um galo rouco canta e uma galinha cega manca
Terreiro grande cercado de Aroeira e Jurema
Um pé de cola outro de siriguela
Limoeiro sem cor
Resina de angico só depois do jantar
Mocanã no colar
Água barrenta lá no barreio
Macaxeira lá na casa de farinha
Maniçoba no chiqueiro de cabras
A floresta de palmas
O céu de estrelas
E o quadro na sala não quer dizer nada.

Rocha.

AvessO>OssevA


Rocha.

21.3.10


Tenho em mim a fome, a sede e o calor do meu antepassado.

*Imagem: minha bisavó, Maria Arlinda dos Reis. (1914 - 2008)

17.3.10

Lugar I

... Logo ali, depois de tudo, precisamente na encantada rua sem saída fica a casa gigante de paredes tortas, na garagem tem o luxuoso fusca branco, a escada tem os degraus curtos e as plantinhas azedinhas, na sala tem a estante de vidro com os elefantes coloridos e o sofá tem o cheiro da , na porta tem o entrando com suspiros e outros doces, na cozinha têm a geladeira azul e a groselha gelada (que outra vez manchou a camiseta da escola), tem os copos da casa e os de visita, os pratos também, assim são com as colheres, a toalha de mesa e as cores dos tapetes no banheiro (eu gostos das “coisas de visita” são mais bonitas). Nos fundos tem um quintal e um pé de chuchu, têm insetos, objetos que ninguém usa e bem ali tem eu com uma bermuda verde sentado no chão com um caracol apertando na mão.

Rocha.

1.11.09

Ponto de Partida.

Mergulhei na chuva
Afoguei-me em poças rasas

Cheguei aqui!

Corri estradas longas
Pisei descalço o chão de pedras

Cheguei aqui!

Perdi o sono
Eu vi o sol nascer três vezes

Cheguei aqui!

Alcancei as alturas da grande arvore
Saltei do prédio no centro da cidade

Cheguei aqui!

Cai em porões escuros
Cavei buracos e surgi no asfalto

Estou partindo.

Rocha Farias.

Moreira Campos. Quem?


José Maria Moreira Campos (Senador Pompeu, 1914 – Fortaleza, 1994)

Não acredito que alguns amantes da Literatura Brasileira ainda não conhecem o Moreira Campos. Infelizmente a pouco reconhecimento dedicado a este escritor que é, na minha opinião, o melhor contista da literatura cearense, senão o melhor do Brasil. Mas não vejo nisso razão para não lê-lo, e até acho que o anonimato no qual ainda reside o contista Moreira Campos o torna um autor ainda mais interessante aos meus olhos.
Semana passada eu fui às Livrarias: Cultura e Fnac, os funcionários não conhecem este escritor e a livraria não tem se quer uma obra dele. Procurei em muitos Sebos, mas também não encontrei nada!
Meu primeiro contato com o Moreira Campos foi quando eu assistia o programa da TV Cultura: Contos da Meia Noite, a estética da sua escrita me despertou muito interesse em pesquisar mais sobre sua Obra, e descobri contos maravilhosos como : As Vozes do Morto, Os Doze Parafusos, Dizem que os Cães Vêem Coisas entre muitos outros...
Aqui vai um dos Contos:
*
As Vozes do morto.
(1963)
*
É possível acreditar nas vozes do morto. Elas devem estar em tudo. Na maneira simplória de Seu Damião, na sua aquiescência, nos seus monólogos e no seu próprio declínio. Ele emagrece sob o enorme paletó caqui. Urina no quintal da sapataria e as formigas miúdas, infinidade delas, vêm sugar o açúcar nas bordas do líquido. Seu Damião toma regularmente uma pílula e bebe água no copo de madeira medicinal, que guarda na prateleira por trás das caixas de sapatos. Mas perde peso: a pele do rosto se desprega a papada. Dança dentro da roupa. Dança todo, por sestros também, que ele é simplório. Leva sempre as mãos à cabeça, escusando-se. Ou melhor, não sabe onde pôr as mãos grandes. Põe-nas na cabeça redonda (cabelo cortado à escovinha) ou as esfrega uma na outra, Parece traduzir nos seus trejeitos um permanente pedido de desculpas por tudo que fez e pelo que não fez. Perdão até de se ter casado com Dona Leonor, que, novinha (e não agora, aquela máscara de pó), não era para se ter dado a ele, um sapateiro de origem, impregnado pelo cheiro da sola, os dedos curtos e chatos grudados de verniz. Dona Leonor estudou em colégio de freiras, segundo ela mesma diz, sem propósito de diminuir o marido, Apenas uma alusão saudosa a outra época:
- A meninice da gente.
Somente isso, com os olhos grandes calmamente perdidos na distância. Ainda hoje experimenta o velho piano na sala, encimado pela toalhinha e pelo jarro de flores artificiais, onde já dormitam moscas, quietas, e reclama os seus dedos:
- Já não são os mesmos!
Tem um riso brando na máscara branca do rosto e tem também na sala de casa uns quadros seus, estudos a óleo natureza morta e Um pôr de sol.
Vem daí certamente, senão uma inibição, pelo menos aquela dúvida de Seu Damião diante da mulher. O jeito seu de, em presença de visitas ou pessoas mais importantes (como se não coubesse entre elas), não externar idéia de maior responsabilidade sem antes con­sultar Dona Leonor por cima dos seus óculos grossos de míope. Como que teme dizer inconveniência ou mesmo disparate, ele tão grosso! Mas Dona Leonor aprova. Então ele leva as mãos repetidamente à cabeça, olhando para o chão ou para os pés:
- Pois muito bem! Muito bem!
Ainda um dia desses, ao receber o casal inesperadamente ali na calçada, à noite, a visita de Dona Cristina, da casa em frente e mulher de Dr. Mário, que vinha para uma palavrinha ligeira (indagar se na sapataria tinha certo tipo de sandália), Seu Damião foi até precipitado. Procurou as chinelas debaixo da cadeira de vime, quase espatifando os óculos. Finalmente calçou um dos pés, e o mais que pôde foi proteger-se por trás da cadeira. E isso tudo porque estava de pijama, assim íntimo! Pedia desculpas, cobria-se e ainda tapava a braguilha com a mão sem necessidade:
- Ora!
- Está em casa, Seu Damião!
- Ora!
E por isso mesmo, e por muitas coisas mais, não se pode a rigor conciliar Seu Damião com a morte do outro. Mas o fato é conhecido e ainda murmurado, apesar do tempo:
- Seu Damião já matou um.
- Sei.
- Por causa da mulher.
- Sei.
Evidentemente um desastre, que teve de fechar sua casa de negócio em Belém do Pará, sapataria de luxo, vindo para aqui, onde reabriu oficina modesta, mas limpa, pegada à sua casa: o bom arranjo das prateleiras, a cortina de gorgorão vermelho na porta do centro do escritório, E ali no balcão Seu Damião recebe a freguesia, surpreendido sempre por cima dos óculos grossos:
- Ah!
Dona Leonor, empoada, funciona na registradora:
- O troco, minha filha.
É delicada.
Possível sem dúvida acreditar nas vozes do morto. Estarão pre­sentes sobretudo nos monólogos de Seu Damião. Os trejeitos, o tique nervoso dos olhos, ajeitando os óculos, os repetidos gemidos, dar de ombros ou a rabiçaca brusca do pescoço. Particularmente enquanto toma a sua pílula. É como se conversasse com o próprio vidro de remédio:
- Ahn... ahn!
Essas vozes, para no fim admitir-se também a inutilidade de tudo, Dona Leonor continuou a ter amante. Uma preferência por rapazes, quando mais nova. Mas chegou a aceitar o chofer do ônibus, que faz ponto na esquina sob o grande tamarindo, Esse tinha bigode caprichado e usava costeletas. Escorava-se no tronco do tamarindo, em conversa com outros, os condutores. Dilatava tempo de partida. Dona Leonor, disfarçada, mãos para trás, vinha até a porta da sapataria, num toque leve do cabelo curto. Olhares, Uma ordem qualquer que ela repentinamente quase gritava lá para dentro, para as oficinas, sem muita convicção, talvez apenas para se fazer mais presente.
O das costeletas acendia mais um cigarro.
Movimentos, todos esses, que eram vigiados por Mercedes, a solteirona da casa próxima. Vigiava-os pela banda de janela, e logo mais estabanadamente largava-se por dentro de casa, cantarolante e arrastando as chinelas:
- Ai, ai, meu Deus!
E depois do chofer, fugaz, veio este de agora, como que definitivo e já aceito pela vizinhança, Alfredo. Faz às vezes de gerente na sapataria. Dá ordem aos empregados. Unhas polidas, poupado de esforços. Será decerto ainda o substituto de Seu Damião no negócio, Dona Leonor muito ciosa dele, de sua saúde, do seu bem-estar, o que por vexes o aborrece:
- Ora, Leonor!
Isso, quando Seu Damião não está, ainda que, por cautela, olhe para os lados. Enfarado. Há de explorá-la: terá exigências, requintes. São sempre vistos os dois em tarde de sábado vindo no mesmo Ônibus e na mesma poltrona, Descem na esquina e voltam a brigar surda­mente, Então os olhos grandes de Dona Leonor parecem aflitos.
- Vem cá, rapaz.
Ele dá de ombros:
- Não, não! Depois.
E larga-se, Ela vem para casa trepada nos seus sapatos de salto alto, já pesada de passo, como se pisasse em ovos, A bolsa pendente do braço, a máscara de pó, os cabelos curtos de acaju, hoje mais amarelados. Cumprimenta grave, uma das vizinhas:
- Boa tarde.
- Boa tarde.
Mercedes, a solteirona da casa próxima, fecha devagar a banda de janela, E logo mais será noite, e com ela o isolamento e a deca­dência de Seu Damião, ao balanço lento de sua cadeira de vime na calçada. Urinou no quintal da sapataria, e as formigas miúdas, infi­nidade delas, vieram sugar o açúcar do líquido. Há de ter tomado também a sua pílula com regularidade. Põe água de molho no seu copo medicinal, que guarda na prateleira atrás das caixas de sapatos. E agora está ali na sua calçada, só, sozinho, sob o beirai baixo da casa. Dá repentinamente de ombros, ajeita os óculos e solta golpe brusco do pescoço:
- Ahn...ahn!
Possivelmente afugenta o morto e aceita a inutilidade de tudo. No mais, a rua é calma e mosquitos voejam em torno da lâmpada triste no poste da esquina, que ontem choveu.